
*Por Yara Dewachter*
Comecei a pensar, a convite do Alexandre Staut, quais são as tendências da arte para 2025… Apesar de ler, estudar, ir à exposições internacionais e nacionais, galerias, espaços independentes, museus, aproveitei a pausa do final de ano pra pensar no tema mais lentamente.
Movimentos artísticos me atraem… bienais e a Documenta me fazem pensar e sair inspirada e modificada. Enfim, tendências começaram a aparecer.
O grupo “Aluga-se” e, agora, o espaço que tem o meu nome “casayaradw”- que fará dois anos em abril – nasceram do desejo de agrupar artistas para acompanhamento e exposições itinerantes, sempre com curadores parceiros e artistas cheios de vontade e talento, e isso reflete meus desejos.
Me veio à mente uma retrospectiva de grupos que conheci e estudei. Me apaixonei quando vi no Guggenheim o Gutai, grupo japonês fundado em 1954. No pós-guerra eles aproximaram a pintura abstrata da performance, indo contra a arte mais reacionária da época.
Allan Kaprow e Marcel Duchamp criam os primeiros happenings, próximos ao Dadaísmo e a PopArt. Eles combinavam artes visuais e teatro, envolviam o público, escandalizavam e faziam muitas críticas sociais.
O Grupo Rex, um dos meus preferidos, contestava o circuito artístico com humor, um grupo autobiográfico. Eram eles: Carlos Fajardo, Frederico Nasser, Geraldo de Barros, José Resende, Nelson Leirner, Wesley Duke Lee, Waldemar Cordeiro. Iniciaram no ano de 1960, em São Paulo.
Tem também o Fluxus, Frente e muito mais. Sempre gostei, acreditei, fiz de maneiras diferentes. Grupos de discussão de poéticas, força para exporem, apoiar o artista que não se sente mais tão sozinho, tudo com durações variadas.
Cheguei na Documenta de Kassel (2022) e pensava; “Nossa! acredito nisso, gosto muito desse projeto.” O Coletivo Indonésio Ruangrupa fez a curadoria e a direção artística. É impossível ser somente um. A ação não se reduziu apenas à exposições, mas a escolas e espaços alternativos. E o conceito de lumbung propõe armazenar o restante da colheita de arroz para o bem comum, no momento em que o inverno chega e a colheita não dá conta de alimentar a todos é que intitula a curadoria. Acho lindo, generoso e absolutamente necessário.
A Documenta de Kassel acontece na Alemanha a cada cinco anos, uma das maiores e mais importante exposição contemporânea e que dita ”tendências”. Espaço para testar novas maneiras de exposição, desafia e discute expectativas da sociedade da arte contemporânea.
Acredito muito nesses conceitos. Gosto de misturar mídias, maneiras pouco ortodoxas de expor, gosto de muitas mídias.
Quando comecei a entrar em espaços variados na Documenta, repito, fiquei pensando que era meu lugar de pesquisa e de vários artistas gestores de espaços alternativos e de coletivos que se espalharam pelas cidades do mundo. Unindo ações educativas e falando sobre a diversidade de etnias em cidades cosmopolitas e fora do circuito tradicional da arte.
Nessa versão ficou claro que o artista isolado no ateliê pode ter ficado ultrapassado. Mas questionamos também algo…. podemos viver como conseguimos e queremos.
Nessa Documenta havia quatorze coletivos de países diferentes, então acredito que isso passou muito de apenas uma tendência.
A Bienal de Veneza de 2024, curada pelo brasileiro Adriano Pedrosa, trouxe um título e um conceito que também mexeram comigo e que acredito também sejam mais uma tendência. “Estrangeiros em todos os lugares”. Claire Fontaine fez a obra em neon que escreve em vários idiomas estas palavras. Então acredito que podemos falar da estranheza que o artista vive. E do deslocamento que está ocorrendo no mundo. Os espaços para gêneros, etnias, refugiados, povos originários, povos de outros continentes, não apenas da Europa.
Penso que o Adriano propôs muitas reparações históricas. No Arsenale, destaque para a sala de cavaletes, absurdamente linda, que mostrava também o trabalho da genial arquiteta (e muito mais) Lina Bo Bardi. Com artistas que nunca participaram da Bienal e a “sala dos retratos”, independente se você gostou ou não, artistas absolutamente importantes, antre alguns esquecidos, não adicionados no livro clássico da história da arte.
No meu conceito, eles viraram um coletivo, como se ficassem conversando sobre que cor usar embaixo dos olhos, porque o autorretrato, deixo um pedaço sem finalizar.
Este ano, a Bienal de São Paulo tem o camaronês Bonaventure Ndikung como curador; vamos pensar humanidade como verbo, um mundo reimaginando as relações. Muito importante na arte e em todos os outros setores. Dentro da nossa casa e do nosso ateliê e com instituições e galerias e muito mais…
Por fim quero falar um pouco sobre espaço independentes. Como não consigo falar de todos que conheço, vou ser parcial:
Projeto Fidalga, Fonte, 397, Desapê, que atuam como incubadoras de artistas. Foi o que fiz com o Grupo Aluga-se e agora com a casayaradw.
Acredito na coragem que o artista precisa ter, para além da sua produção, gerir um espaço, dar aula, escrever, se inscrever em editais, na bienal, montar e apresentar projetos. Tudo isso fica melhor quando se tem amigos, quando se participa de um grupo que você confia, monta a curadoria desse grupo e se apresenta nos mais variados espaços, chama um colecionador para tomar um café e se atualizar do seu trabalho e de ideias.
O ano começou e vamos misturar essas tarefas e dar conta de tudo!
Como disse o saudoso Nelson Leirner, vamos “Destruir para Reinventar”.
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Natural de São Bernardo do Campo, São Paulo, Yara Dewachter é uma artista que mergulha na experimentação de matérias primas e narrativas: da fotografia com cera de abelha aos desenhos e objetos de assemblage. Seu trabalho investiga as relações familiares, a projeção do feminino e suas violências a partir da produção e apropriações de imagens frutos das andanças pelas cidades.
Com participações em salões de arte, prêmios e exposições internacionais, como em Svendborg, na Dinamarca, Yara continua a expandir seu alcance artístico. Por 9 anos à frente do Grupo Aluga-se, organizou mais de 30 exposições, ações e iniciativas itinerantes em diversos estados brasileiros. Sua série “Eu Queria Ser Ela”, iniciada em 2013, captura a força das mulheres em suas jornadas diárias por ruas e territórios. Seu compromisso com a representação do feminino também se reflete em projetos como Camélias, uma série de desenhos retratando uma centena de mulheres da história brasileira.
Atualmente, lidera a Casa Yara DW, um espaço que vai além de seu ateliê e abriga exposições, cursos de arte e eventos culturais. Em sua mais recente publicação, Vira-lata, lançada em 2022, Yara une suas imagens e textos a performances, consolidando assim sua carreira como artista multimídia. @yaradewachter