* Da Redação *

Este ano, a São Paulo Review faz uma lista inusitada dos melhores livros do ano. São romances, antologias de contos e poemas que, provavelmente, você não vai encontrar em outras listas. Muitos passaram despercebidos pela mídia, a maioria foi lançado por pequenas editoras. Talvez não figurem nas listas de premiações, no ano que vem (embora torçamos pelo contrário). Alguns são regionais e não vão chegar à grandes redes de livrarias. Todos têm em comum um aspecto: são bons livros. Por isso merecem ser lidos. A lista foi preparada pela equipe da São Paulo Review em conjunto com nossos críticos, Sérgio Tavares e Raimundo Neto.

 

  1. Ensaios para a queda (Penalux), de Fernanda Fatureto

Os poemas do livro são organizados de forma a alcançar um ritmo narrativo marcado pelo espontâneo da oralidade, que raramente descobre uma rima, porém, quando isso ocorre, ilumina todo o conjunto. Tal efeito é obtido por conta do cuidado na escolha das palavras, pela habilidade admirável de transfundir passagens da existência real com pulsões subjetivas, constituindo versos que, ora em vez, irradiam o apelo de uma frase de efeito, sem que a praxe comprometa o poder de beleza e o vigor imagético.

 

  1. A oração do carrasco (Mondrongo), de Itamar Vieira Junior

Ainda que distintos em temas e formatos, os contos do baiano Itamar Vieira Junior acompanham personagens que estão em busca de algum tipo de liberdade. Seja no coração de uma tribo indígena ou no porão de um navio clandestino, o desejo de se apartar de uma condição dominadora é o meio de salvar a si ou a um outro ao qual se está enlaçado por conta de um sentimento, de um legado, de uma hereditariedade.

 

  1. Interrompidos (Reformatório), de Alê Motta.

Em seu livro de estreia, a carioca Alê Motta cumpre à risca a tese de Ricardo Piglia em todo seu potencial de compressão. Os micro-contos de Interrompidos celebram esse caráter duplo, cujo núcleo carrega um relato futuro, porém não escrito, oferecido ao leitor na forma de sugestão.

 

  1. Van Ella Citron (Micronotas), de Bruna Sofia Morsch

Uma mulher decide sair de casa para viver nas ruas como prostituta e, ao longo de sua jornada, leva o leitor a reflexões sobre a busca frenética por status e reconhecimento. Este é o fio condutor do romance da catarinense Bruna Sofia Morsch, que aborda com sensibilidade temas tabus na nossa sociedade

 

  1. O cão mentecapto (Encrenca), de Otavio Linhares

Este livro é regido por uma brutalidade que se injeta pelos veios da infância. Nos 16 contos que integram o terceiro livro do autor curitibano, os personagens se encontram em ocasiões de transformação e de (auto)estranhamento, através das quais a percepção de mundo passa por um filtro desfigurador que condiciona a violência como um meio irremissível de formação.

 

  1. Não há amanhã (Zouk), de Gustavo Melo Czekster

Em sua segunda coletânea de contos, o escritor gaúcho constrói um panorama que reflete uma realidade cujas fissuras são infiltradas pelo fantástico, sem que o assalto do inexplicável cause aos personagens uma experiência traumática de horror. São raias desse abismo cotidiano no qual transitamos sem presciência, a mercê do fato incrível que repercute em ondas pela cidade, do delírio e do assombro que se deslocam pela casa e enredam as relações familiares, do achado de si diante da finitude invicta. Tal como descreveu Cortázar, uma realidade enriquecida.

  

  1. Guernica (Edições Udumbara), de Moema Vilela

É do mínimo (não do que é pequeno e invisível) que começam as cenas em Guernica, e avançam, sempre dentro das personagens, para algo maior, como o simbolismo que Picasso produziu em sua obra.

 

  1. Deus é bom e o Diabo também (Dobradura Editorial), de Mahana Cassiavillani

Em cada conto, um santo e um demônio, um deus e um diabo, de mãos dadas: ninguém está salvo ou condenado. Na vida escrita nos contos de Mahana é tudo um jeito de salvar-se ou deixar-se.

 

  1. O peso do coração de um homem (Editora Patuá), de Micheliny Verunschk [na foto]

Duas crianças com nomes nascidos na brutal rivalidade entre famílias aprendem a sobreviver sentidos e ferozes nas brenhas de uma violência que existe e prepara-os para fugir e matar ainda assim. Uma família “desfigurada pelo tempo” e uma vingança constituída salvação.

  

  1. Oito do sete (Editora Reformatório), de Cristina Judar

É difícil apontar qualquer tentativa de definir o romance: está para além de gênero, como os personagens estão para além de gêneros; e é a linguagem (jorrando o tempo inteiro do romance aos pedaços) que dá a potência do livro.

 

  1. Morri por educação (Editora Oito e Meio), de Nathalie Lourenço

A sutileza de catástrofes íntimas contadas com bom humor, dores abertas sem chance alguma de cura. Se existe o amor nos contos, está ali para devorar o bem querer, e dentro do peito, uma bomba prestes a ser acionada.

 

  1. Todas as coisas sem nome (Cepe Editora), de Walther Moreira Santos

As coisas sem nome escritas por Walther, nos contos do livro, vão de lacuna a lacuna conjurando poesia em cantos que podem ser qualquer lugar do mundo. As perguntas ditas nos contos, por alguns personagens, apontam para transcendências e desastres, futuro e tantos outros abismos, produzindo no leitor a sensação-desfiladeiro e estropiada de “céu e coração cada vez mais escuros”.

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