Por Angelo Mendes Corrêa e Itamar Santos *

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Escritor, professor, jornalista, artista plástico, músico e engenheiro, Paulo Ludmer pode, sem nenhum favor, ser definido como um homem múltiplo. Ligado às vanguardas artísticas paulistanas das décadas de 1960 e 1970, conduziu, por quase duas décadas, uma oficina de escrita ao lado de Carlos Felipe Moisés. Tem 25 livros publicados e na escrita concisa uma busca permanente. No jornalismo, integrou, dentre outras, as equipes do Pasquim,  Folha de S.Paulo e Jornal da Tarde, além de ser um dos maiores especialistas brasileiros sobre questões energéticas. Falamos com ele.

Pode nos contar um pouco sobre sua formação? Não fiz o primeiro ano do primário. Precoce, saltei ao segundo. Ganhei de meu pai, quando aprendi a ler, revistas em quadrinhos, tudo da Senhora Leandro Dupré e de Monteiro Lobato. Frequentava, com meu pai, as matinês dominicais de cinema infantil. Ganhei o Tesouro da Juventude que devorei. No Colégio Estadual de São Paulo, ex-Presidente Roosevelt, depois de ter sido orador da turma de formandos do primário do Grupo Escolar Prudente de Moraes, de onde saí em 1952, tive a dádiva de ser aluno do professor Trevinho, de português, que me apresentou tudo de Machado de Assis, José de Alencar, Bilac, Eça, Camilo Castelo Branco e outros. Também fui premiado pelo convívio, no ginásio, com Carlos Felipe Moisés, poeta e literato, e Decio Bar.

Aos 14 anos escrevi as tonterias da estreia. Aos 17 (nasci em 1944) quis cursar filosofia e direito. A família vetou. Entrei na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Traumatizado, demorei oito anos na Poli, mas ali criamos o ‘Traditional Jazz Band’, onde toquei percussão por uns dez anos. Fiz litogravuras na Faap. Me formei psicodramatista com Marisa Greeb. Realizei várias exposições de pinturas, solo e coletivas.

Compartilhei um ateliê com José Roberto Aguilar. Frequentei o Embu e perenemente a casa de Fernando Odriozola. Convivi com Claudio Willer, Maninha, Roberto Bicelli, Consuelo de Castro, Piva, Mautner, Hector Babenco, Marjorie Sonencheim, Placido Campos, Celia Igel, Leila Raw, Jeanete Priolli… enfim, os malditos dos anos 1960.

Tornei-me jornalista. Publiquei uns 25 livros, sendo vinte solos. Lecionei 33 anos na Faap (Jornalismo Econômico, Problemas Brasileiros, Ética, Antropologia Cultural e Criatividade). Sou professor de pós nas engenharias da FEI e do Mackenzie. E também Conselheiro de Sociologia, Política e Economia da Fecomércio…

Que autores vê como essenciais a todos que se dediquem ao ofício da escrita? Os autores indispensáveis a todos não existem. A pulsão de escrever é uma singularidade. Não posso listar Cervantes, Kafka, Clarice, Pessoa, Borges ou Singer, dos quais gosto. Nem posso me deter na civilização judaico-cristã ao pensar na Ásia.

Há no ato de escrever um disfarçado narcisismo? No ato de escrever estamos inteiros. Nosso narcisismo, na fração que o temos, comparece com o todo que somos. Não vem disfarçado ou expresso, apenas atua.

Considera quer poesia é predominantemente inspiração ou transpiração? Poesia surge de inspiração. Em seguida, é muito trabalho. É esculpir uma rocha enorme. É técnica de cinzel. E outras. Acontece de um porre no bar propiciar uma regurgitada poética. Mas a quase totalidade dos poemas vem de trabalho.

Realiza-se mais na prosa ou na poesia? Me realizo quando a forma e o conteúdo superam minha insatisfação e o desejo de mudar. Escrever é reescrever. A taxonomia, se prosa ou poesia, ou o nome que seja, não me interessa. Pessoalmente, luto muito contra o meu hermetismo. O teor deve adquirir sentido sem fatigar o leitor, às vezes sem roubar dele fragmentos de emoção.

A concisão da linguagem é uma das características mais marcantes de sua escrita. Influência de sua formação nas ciências exatas? A concisão é um templo em mim. Não sei a razão. Especulo que deriva de impaciência, gosto estético, primado da obsessão sobre a histeria. O Carlos Felipe Moisés aumentou meu apreço pela concisão. O Dalton Trevisan também. É dizer tudo no mínimo. É evitar até uma vírgula gordurosa sobrando.

Seu trabalho de artista plástico dialoga com o escritor? Não no plano racional.

Seu nome figura como um dos mais destacados especialistas em questões energéticas em nosso país. Algo a dizer sobre a crise que ora enfrentamos? O lulopetismo destruiu o setor energético brasileiro. Será muito complicado corrigir a demolição consolidada. Escrevi dezenas, centenas de artigos denunciando o que se passava e a desindustrialização que se avizinhava. Envolver é fácil. Comprometer, quase impossível. A sociedade brasileira mal sabe o custo do eventual conserto do que aprontou numa combinação de ignorância e má fé. Meu próximo livro de política energética, intitulado “Hemorragias elétricas”, aguarda patrocínio.

Algum balanço a fazer? Planos para 2015? Espero recuperar a visão para publicar o Hemorragias elétricas, que está pronto atrás de patrocinador. Tenho material suficiente para um novo livro de ficção. O último foi Fonte , da AGE, em 2007. Mas, creio que em 2015 poderei reler e concluir o produto livro ainda sem nome. Se puder, visite o www.pauloludmer.com.br

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Angelo Mendes Corrêa é mestre em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo (USP). Itamar Santos é mestrando em Literaturas Comparadas de Língua Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP)