A família como território de desterro, como uma pátria de solo envenenado, que nunca é passível de ser abandonada completamente. Laços de sangue. Laços de fantasmas. O difícil das relações familiares é caro para a escritora italiana Lisa Ginzburg. Com seu Cara paz, finalista do Prêmio Strega 2021, arquitetou a relação de duas irmãs “órfãs sem jamais terem sido”. Em A pluma escondida, Tan chega, no começo da sua adolescência, para ser acolhido no lar dos Manera, que há tempos sonha com a ideia de cuidar de uma criança. Sua intempestiva chegada, no entanto, lança a todos no vazio de uma pergunta sem resposta certa: onde encontramos o grau zero, a semente, dos laços entre pais e filhos?
Enquanto a pergunta se desenrola, todos são observados por Rosa, a filha dos caseiros dos Manera, que se sente ela própria “órfã”, diante do impasse dos pais em demonstrar carinho. O sentimento de orfandade acaba unindo os dois jovens numa relação insular, que desperta desejos que apenas serão compreendidos com o passar dos anos. Rebelde com causa e com um passado desconhecido e incerto, Tan implode o casamento dos novos pais, a si próprio e, pior, sua ligação com Rosa. É justamente sobre esse momento, em que todas as ideias de família parecem não dar mais conta do mundo, que Ginzburg nos fala no seu romance, que tem como uma espécie de narrador onisciente as paradisíacas paisagens da Toscana.
O título do livro, o misterioso jogo por trás da expressão Uma pluma escondida, acompanha a narrativa como uma espécie de refrão, que ecoa nos ouvidos dos personagens e dos leitores. Um refrão que nos lembra que em algum momento seremos convidados a voltar para casa outra vez. Onde quer que isso seja.
Sobre a autora:
Lisa Ginzburg é formada em filosofia pela Sapienza University. Romancista, tradutora e ensaísta, é autora de romances como “Per amore” e “Desiderava la bufera”. Com o romance “Cara paz”, publicado pela Nós, foi finalista do Prêmio Strega 2021, o mais prestigioso da literatura italiana.