Reserva Natural (Companhia das Letras, 2018), de Rodrigo Lacerda. Em dez contos, Rodrigo consegue atingir o âmago do ser humano a partir de tramas que percorrem aquilo que é, aparentemente, prosaico. Ao narrar histórias de pessoas em momentos corriqueiros, o autor conduz o fio narrativo para situações em que estas não conseguem controlar, o que abre espaço para o impulso, o impensando, o inesperado. A grande força desse livro está na intensidade humana colocada nele, em que a reserva natural do título adquire contornos profundos, bem delineados e, ao mesmo tempo, capazes de segurar o leitor. O que mais se pode desejar de um bom livro?

 Três contos (Cosac Naify, 2004), último livro concluído por Gustave Flaubert, que deixou inacabado o seu monumental Bouvard e Pécuchet, este que é considerado o maior estilista da literatura realista do século XIX, presenteia o leitor com três contos completamente distintos entre si, mas que foram escritos com o intuito de serem um tríptico. Nesta obra, Flaubert narra a vida de pessoas simples, tocada pela benevolência, a maldade, a estigmatização. Se há algo que claramente une as três histórias, pode-se dizer que, aqui, temos três narrativas de vidas conturbadas, além de vermos traçado um grandioso panorama da França de sua época e crítica a religiosidade, elementos presentes em outras de suas obras. Embora essa edição da Cosac não esteja mais no mercado, o livro continua disponível em outras edições.

 Contos de Tchékhov Vol. 1. (Relógio d’água editores, 2001). Como a edição dos contos de Tchékhov (acima, na foto) no Brasil é feita de maneira muito esparsa e diluída, adquiri esta edição portuguesa dos contos do russo Anton Tchékhov, cujo volume X acaba de ser lançado em Portugal. Mestre absoluto do conto, que deve ser lido por quem quer que almeje escrever e publicar, ou por qualquer apreciador de boa literatura, a potência das histórias do autor reside em sua capacidade de “transmitir uma impressão de beleza artística muito superior à de numerosos escritores que pensavam saber o que era uma prosa rica e bela” (Nabokov). Embora não fosse um grande inventor da palavra, embora não tivesse grandes recursos de estilo, a prosa de Tchékhov é exultante justamente por saber iluminar de forma única com as luzes que têm, trazendo para o palco, desnuda, toda a nossa (des)humanidade.

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Marco Severo nasceu em Fortaleza, onde vive. É graduado em Letras/inglês pela Universidade Federal do Ceará. Colabora mensalmente com sites literários e tem contos publicados no exterior. Publicou Os escritores que eu matei (crônicas, 2015), Todo naufrágio é também um lugar de chegada (contos, 2016), Cada forma de ausência é o retrato de uma solidão (contos, 2017) e Coisas que acontecem se você estiver vivo (crônicas, 2018). Em 2019 publicará seu terceiro livro de contos, Se eu te amasse, estas são as coisas que eu te diria, todos pela editora Moinhos.

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