* Por Walther Moreira Santos *

Há soberba e indiferença nas grandes lojas de rede montadas nos shoppings centers, que após atropelarem os livreiros nos anos noventa, passaram a exigir dos editores muito mais que os 30% há séculos acordados sobre o preço de capa, onerando assim o livro e implodindo toda a cadeira produtiva.

Há soberba e indiferença nos escritores nacionais que só têm olhos para os autores estrangeiros – lidos quase sempre de segunda mão, via traduções – enquanto passam longe dos livros de seus pares.

Há soberba, indiferença e um cinismo sem precedentes nas concessões de tevês e rádios que não dedicam espaço algum para o livro, reservam quase toda a programação para o futebol e não raro se perguntam o porquê de não sermos um país de leitores e sim do futebol.

Há soberba e indiferença nos pais que nunca levaram ou levarão os filhos a uma livraria, biblioteca ou para eles leram coisa alguma; deixando toda a responsabilidade pela sua formação para a escola.

Há soberba e indiferença nas escolas que não possuem biblioteca.

Há soberba e indiferença nos organizadores de eventos literários que adoram produzir feiras internacionais para trazer um autor do “Curquistão” e se esquecem que um escritor isolado na Serra Catarinense ou no interior do Piauí é tão estrangeiro em sua terra quanto qualquer outro escritor internacional

Há soberba e indiferença nas editoras que não possuem qualquer programa de formação de leitores – quando o mais relés traficante sabe que é preciso formar público para o seu produto, por isto a primeira pedra de crack é distribuída gratuitamente nas escolas.

Há soberba e indiferença nos organizadores de eventos literários que adoram produzir feiras internacionais para trazer um autor do “Curquistão” e se esquecem que um escritor isolado na Serra Catarinense ou no interior do Piauí é tão estrangeiro em sua terra quanto qualquer outro escritor internacional.

Há soberba e indiferença nas universidades. Onde estão os programas escritor residente? Onde estão os eventos literários? A maioria não possui sequer uma disciplina de literatura contemporânea e ainda se debruça sobre o dilema se Capitu traiu Bentinho.

Há soberba e indiferença nas prefeituras que abrem os cofres para a gastança com vaquejada e rodeios – atividades criminosas – quando na maioria das vezes não possuem sequer biblioteca.

Há soberba e indiferença nas editoras que não dão desconto para os leitores do livro no formato digital, ou aumentam o percentual de direitos autorais para o autor; quando sabidamente este formato em muito barateia o custo de produção.

Há soberba e indiferença na maioria dos mais de cinco mil municípios do Brasil que não possuem nenhum evento voltado para o livro ou formação de leitores.

Há soberba e indiferença nos gestores de prefeituras, bibliotecas, ONGs e produtores de feiras literárias que adoram pedir livro, palestras e oficinas de graça àqueles que realmente militam pelo livro, enquanto desaparecem com toda a verba que põem a mão.

Há soberba, indiferença e leniência nos órgãos que concedem licença a universidades caça-níquel que não possuem qualquer biblioteca.

Há soberba, indiferença e um desserviço sem precedentes nas escolas que exigem a leitura de determinada obra, quando a via ideal de formação deveria se dar através da livre escolha, do afeto e não da exigência.

Há soberba e indiferença no mercado do livro no Brasil. Senhores, que sua enumeração exceda qualquer artigo, manifesto ou paciência e explique o porquê de nunca sairmos desse fundo de poço.

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Walther Moreira Santos é escritor e palestrante. Autor de O Ciclista, O metal de que somos feitos e Todas as coisas sem nome, entre outras obras

 

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