* Por Alexandre Staut *

O paulistano José Carlos Honório, ou simplesmente Zeca, como é conhecido na Livraria Cultura, é o funcionário mais antigo da casa. Conheceu a livraria por meio de um marcador de páginas, dentro de um livro emprestado por um amigo. Desde então, há mais de 30 anos, trabalha em meio aos livros e pessoas, o que mais gosta de fazer. Costuma ser procurado por artistas e formadores de opinião, que fazem questão de ouvirem as suas indicações. Hoje, é curador e gestor da loja de arte da livraria. Muitos não sabem que ele também é escritor e poeta elogiado por nomes como Evandro Affonso Ferreira. Nesta entrevista,  Zeca fala da sua formação como poeta, sobre o mundo livreiro e dá dicas de leituras.

Poderia falar da sua trajetória como poeta? Comecei a escrever, lembro até o dia, tanto é que comemoro o aniversário de escrita,quando estudava no Senai, ambiente masculino, dia 1º de outubro de 1979, numa aula de Ciências com o professor Tadeu. Foi escrito um poema pueril, até bobo, sobre a natureza e o amanhecer. Tenho ele até hoje. A poesia sempre esteve presente em meus dias, desde a infância. E continua. Lia Rilke, Manuel Bandeira, Drummond, Hilda Hilst, Adélia Prado, Rimbaud, Herberto Helder, Fernando Pessoa e por aí vai…

E qual foi o poema que mais te tocou, lá no início? Minha trajetória provavelmente é muito parecida com outros poetas: olhar o horizonte, melancolia, amor incompreendido, em demasia, em profusão, em falta, sempre foram a tônica de meu tracejar. Deus nunca me incomodou.Os poetas que sempre comigo estiveram, lado a lado foram Rilke, Rimbaud, Drummond, Manuel Bandeira, Manuel de Barros, Sophia de Mello Breyner Andresen, Fernando Pessoa, Hilda Hilst, Herberto Helder, Murilo Mendes, Anka Kowalska. Tabacaria lá no início me tocou muito.

Quando percebeu que ia escrever poemas? Podia falar das suas primeiras publicações? Nesse dia 1º de outubro de 1979, notei que não era minha essa questão de escrever ou não a partir dessa data, escrevia diariamente. Tive experiências bastante significativas tanto amorosas, quanto sensoriais que me fizeram entender que precisava dar um rumo para o que andava sentindo. Pensei: é um tracejar que devo seguir. Sofria ao escrever  para saber que era capaz de suportar, e isso me dava uma estranha potência… Escrevi Em Breve Outra Noite, O céu nu e a biruta, O mar é tarde demais, No Deus que o diga dos dias, Atravessar teu corpo, Dias de colecionar borboletas.

E o conto, quando apareceu na sua vida? Seu livro O céu nu e a biruta foi prefaciado por Caio Fernando Abreu. Aliás, Evandro Affonso Ferreira já me disse que você é um ótimo contista. Não sou muito bom de conto. Sou muito aéreo. Nem de romance. Só tenho um livro no gênero. Caio foi muito amigo. A gente se dava muito bem. Querido! Evandro é outro querido… Ele exagera.

Como anda a sua produção? Estou finalizando um novo livro. Logo, logo…

Quais autores tem lido? Quem tem lhe inspirado a escrever? Tenho lido muito psicanálise, que é onde estou atuando agora. Leio também Clarice, sempre. Moravia, Pavese, Dino Buzzati, Borges, Hilda, continua linda. Leio Lygia.  A coisa que mais faço é ler.

Impossível falar com você e não citar o seu trabalho na Livraria Cultura. Poderia falar um pouco sobre os clientes que lhe acompanham? Adoro falar de literatura, arte, psicanalise, filosofia com as pessoas. Acho que por isso me procuram. O ser humano me interessa. Crio vínculos com clientes que se mantêm.

O que mais tem lhe chamado a atenção no mercado editorial nacional? Livros infantis, de gastronomia, de fotografia têm me encantado. Trazem além de cultura, prazer.

Se tivesse que escolher cinco livros disponíveis na Livraria Cultura, hoje, quais seriam? Escolheria toda Clarice, toda Hilda, todo Dostoiévski, todo Moravia, todo Murilo Mendes.

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Alexandre Staut é escritor e editor da São Paulo Review

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