O Limoeiro

De pele bem grossa

Tal qual a da cobra os fiz

À prova do bico dos colibris

 

Esmeraldas gotejando de um vestido

Quero praqui e pracolá

Com meus braços limões deitar

 

Porém os cotovelos e sovacos

Eis que me vem roçar

A pilha de tijolos que aumenta

 

Para cima e para os lados

Que o homem, quanto mais junta

Mais precisa deles se rodear

 

A este o chamam de muro

Se fosse por mim chamava de estorvo

Com as pernas lhe passo rasteiras

 

Poeta um houve que disse

Boas cercas fazem bons vizinhos*

No entanto sou eu

 

Deitando meus frutos

Por sobre o pobrezinho

Que faço assim bons os vizinhos

* Robert Frost, “Mending Wall”

 

Jardim Botânico

Todas as vezes que fui ao Jardim Botânico

O bilhete que me permitia a entrada

Para além da catraca era um bilhete mágico

Pois na realidade num sonho eu ingressava

 

As aleias silenciosas e perfumadas

A plaqueta indicando o pau-brasil,

Caesalpinia echinata

A escada de pedra até os macacos

O orquidário e a estufa das bromélias,

Alvéolos dos pulmões do parque

Uma avenida de palmeiras ditas imperiais

Fazendo lembrar a nave de uma catedral

 

Este sonho não é meu, estou no sonho alheio

De um imperador que sonhou ser borboleta

 

E como tal flutuo até o Parque Lage

Onde num de seus cantos encontro a barra

Do traje do Redentor me indicando o caminho

Que sigo trama de ramos e trilhos até o cimo

 

E por fim, a seus pés, contemplo um sonho maior

Movimentos de uma sinfonia de mar e montanha,

Que o homem desfaz à sua semelhança

 

árvores nas calçadas

sozinha, a pé, indo para a escola…

 

os diversos tons

do verde das folhas das árvores

traduziam

 

os meus sentimentos de mundo

 

a árvore da minha infância

ao primo Luciano Gava

o pessegueiro era uma ideia

da árvore sendo casa

 

nossa casinha

os seus galhos

 

as folhas nos protegiam

do vento e do sol

do calor intenso

 

os espaços entre as folhas

eram as janelas da nossa casa:

nossos olhos e alma

*

Os dois primeiros poemas são de autoria de Mauricio Vieira; os dois seguintes são de Cristiane Grando. Eles assinam a quatro mãos o livro Arvoressências (Editora da Cultura, 60 págs.)

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