O romance Dois irmãos (2000), de Milton Hatoum, recriado em HQ pelos gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá, começa a ganhar edições em diversos países. Em breve, a tevê Globo lança a minissérie adaptada do mesmo livro, em trabalho de Maria Camargo e Luiz Fernando Carvalho.

Duas outras obras do amazonense também estão sendo levados às telas de cinema, Órfãos do eldorado, livro lançado em 2008, foi vertido para o telão pelas mãos de Guilherme Coelho e já teve estreia nacional no Festival de Tiradentes; e Relato de um certo oriente (1989), que está sendo adaptado por Marcelo Gomes.

No depoimento concedido a Alexandre Staut, Hatoum conta alguns detalhes das obras e do seu sentimento em relação às adaptações. Fala ainda sobre o escritor alagoano Graciliano Ramos, uma de suas inspirações de todos os tempos.

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A história em quadrinhos de Dois irmãos foi feita pelos gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá, dois ótimos artistas gráficos. Eles haviam feito a adaptação de O alienista, do Machado de Assis. A ideia ocorreu numa mesa de bar, numa das edições da Flip. O resultado ficou excelente. A dupla fez um recorte do romance. O essencial está lá. A linguagem é diversa daquela do livro. O desafio foi combinar desenho com texto. Às vezes, há páginas em que só o desenho se basta, não é preciso haver palavras ou balões. Achei lindo.

O livro começa a fazer percurso internacional. Foi bem recebido na França, na ocasião do Salon du Livre de Paris deste ano. Agora vai para outros países. Há interesse de editoras europeias, americanas e asiáticas.

Houve um lançamento em Manaus. Dizem que foi incrível. Muita gente! Infelizmente não pude estar presente.

Há ainda outras adaptações a caminho. Uma delas, já concluída, é ‘Órfãos do eldorado’, de Guilherme Coelho, que traz Dira Paes e Daniel Oliveira. Não vi ainda. Vou assistir em breve. Disseram-me que ficou muito boa.

Há a minissérie ‘Dois irmãos’, projeto da rede Globo, que está sendo filmado. Conheço a equipe, o Gustavo Carvalho dirigiu ‘Lavoura arcaica’, da obra do Raduan Nassar. A roteirista é minha amiga, Maria Camargo. Li o roteiro, que é muito bom. Parte foi filmada em Manaus. A equipe volta a Manaus em breve para as finalizações. As fotos são lindas. Não tenho acompanhado de perto, para não ficar em cima, atrapalhar.

Relato de um certo oriente vai ser adaptado por Marcelo Gomes. O roteiro é dele e mais uma vez de Maria Camargo. O cineasta é muito bom, talentoso, sensível. Fez ‘Cinema, aspirinas e urubus’, ‘Viajo porque preciso, volto porque te amo’… dois ótimos filmes.

Finalmente, um conto do livro A cidade ilhada vai ser filmado por Sergio Machado. Essa é a única adaptação da qual vou participar. Não exatamente como roteirista, mas como escritor que participa do argumento. Estou escrevendo uma narrativa que completa este conto.

A Maria Camargo praticamente participou de todos os projetos. Acho que eles vão ser muito bacanas. Tive sorte com meus cineastas e quadrinistas. Fizemos acordo porque conheço o trabalho desse pessoal. Se conhecesse e não gostasse não concordaria com as adaptações.

Claro que a adaptação mais esperada é de Dois irmãos para a TV. Meus leitores me escrevem, perguntam. Querem detalhes. Eu não posso nem mandar as fotos. O Luis Fernando talvez esteja começando a divulgar algumas. Esta obra na TV vai ser importante para o Brasil conhecer um pouco mais de Manaus.

Manaus profunda

Alem do drama familiar, do drama do romance em si, tem a linguagem e o conhecimento da Amazônia e de Manaus. A cidade é uma personagem do livro. A minissérie é uma forma de oferecer ao público a oportunidade de conhecer a cidade, não na superfície, mas profundamente… os dramas do lugar.

Manaus foi muito maltratada. Até hoje não tem árvores, nem calçadas. Uma parte da capital não tem infraestrutura urbana básica. Não é uma cidade que arrecada pouco, é rica!  Do ponto de vista da arquitetura, o lugar foi detonado… a arquitetura histórica. Sou arquiteto de formação e isso me entristece. Acho que deve ser repensado. Esta barbárie é totalmente condenável.

Graciliano Ramos

Li parte da obra do Graciliano quando era estudante do ginásio em Manaus. Era jovem, devia ter 14 ou 15 anos. Fiquei fascinado pelo mundo do autor. Depois li toda a sua obra. Foi importante para a minha vida, para os livros que escrevi.

Graciliano é um escritor de uma exatidão, de uma clareza impressionante. É um grande estilista. Tem estilo seco, conciso. Salvo pelo romance Angústia, que é mais caudaloso. É um livro diferente dos outros.

É um escritor que escreveu o essencial. Não falseou! Escreveu aquilo que foi fundamente para ele. Apenas o que tocava a sua alma. Um grande escritor da nossa língua.”

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