* Por Cintia Moscovich *

Um dos assuntos que mais divertem, e preocupam, os judeus e não judeus em todo o mundo é, sem sombra de dúvida, a loucura do louco — o meshugá que dá título a esse novo romance de Jacques Fux.  A maluquice judaica essencial, além de envolver alguns temas clássicos (neurose, hipocondria, mães invasivas e super-protetoras, etc.), também fornece matéria para a ironia autodepreciativa que é a base do humor desse povo.

Valendo-se da ficção com mão firme, Fux apresenta um rol de personagens tão geniais quanto desnorteados, histórias que se conformam como pequenas novelas e que são pérolas da insanidade e do ridículo. Woody Allen, Sigmund Freud, Bobby Fischer, e outros desfilam aqui suas incongruências, extravagâncias, delírios e atos extremos, formando um mosaico que pretende compreender por um lado o auto-ódio e, por outro, a batelada de teorias e lendas nem sempre elogiosas que cercam o povo judeu e que desembocaram todos sabemos onde.

Nesse verdadeiro ensaio sobre a loucura, o autor constrói, camada a camada, um clima de tensão que vai se adensando, um desconcerto que inquieta e que seduz — a história de Danny Burros, por exemplo, é um thriller da melhor extração. No capítulo final, o leitor percebe, não sem horror e angústia, que cada uma dessas pretensas biografias é apenas uma volta a mais num parafuso que se está a apertar desde o início. Exercício de evisceração da alma, Jacques Fux oferece um resumo sincero, elegante e potente da doidice ancestral, aquela que fundou e que que continua alimentando não só a loucura de toda a humanidade, mas também, e felizmente, o humor que alivia e a arte que redime.

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Cintia Moscovich é escritora

Meshugá: um romance sobre a loucura, de Jacques Fux (Editora José Olympio, 196 págs.)

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