Uma festa literária é feita de encontros

Por Viviane Ka *

Do que é feita uma festa literária?

Uma festa literária é feita de encontros.

Encontros do público com livros, escritores, de autores com seus leitores, poetas, músicos, chefs de cozinha, cineastas, animadores, todas as formas de cultura reunidas num cenário poético. No caso da Flipoços, em Poços de Caldas (MG).

Em sua décima edição, a festa idealizada por Gisele Corrêa Ferreira, que é do conselho editorial da São Paulo Review, foi um sucesso absoluto. Com formato intimista, o evento reuniu nomes consagrados da literatura e também novos talentos, sem medo de ousar.

Pelo Espaço Cultural da Urca circularam escritores tão diversos como Alex Sens, jovem escritor paranaense, amante de Virginia Woolf e Sylvia Plath, lançando seu livro O frágil toque dos mutilados e a poeta local Darlen Pio, com seu concerto de poesia, fazendo versos de improviso, captando de uma maneira simples e pura, a essência de cada alma ali presente em forma de poemas musicados.

Um chef galã egresso de reality show de televisão deu aula de culinária mineira com toque gourmet logo após a palestra da sobrinha-neta de Tarsila do Amaral, a Tarsilinha, que contou um pouco sobre a participação pintora no movimento modernista de 1922.

Neste caldeirão cultural efervescente misturam-se cordelistas vestidos de Lampião, músicos da orquestra Jazz Sinfônica de São João da Boa Vista, em impecáveis ternos negros, livros de pano bordados por comunidade de mulheres alcóolatras com literatura LGTB e a participação da escritora Bel Barbiellini, com seu livro O outro lado do muro, sobre um triângulo amoroso entre mulheres.

Teve jovens blogueiras como Tati Machado, Aimée Oliveira e Clara Savelli, vindas direto da internet e presentes na festa com seus sonhados livros impressos em contato direto com os leitores.

Ana Miranda, consagrada escritora, ganhadora de prêmio Jabuti com os romances Boca do Inferno e Dias e Dias, fechou sua palestra com uma aula generosa sobre construção narrativa, que ela mesma aprendeu com Rubem Fonseca.  Uma inspiração para todas as mulheres e para todos que desejam fazer da literatura sua forma de expressão.

É impossível, ao entrar em contato com esse universo da escrita, dizer que as pessoas não gostam de ler. Pelo menos em Poços de Caldas se lê mais do que o dobro da média nacional, diz pesquisa.

Entre mil sons diferentes, vozes, cantorias, declamações de poemas, o cronista e editor Edson Aran revela os bastidores do seu processo criativo como roteirista do novo programa da TV Globo, Zorra, totalmente reformulado. Logo após parte para sua palestra sobre liberdade de imprensa e Charlie Hebdo com o cartunista Caco Galhardo e João Montanaro, que começou a desenhar aos 13 anos.

Jovens leitores foram presença maciça no evento. Thalita Rebouças, que como disse a jovem leitora, entende a linguagem dos jovens e Pedro Gabriel, com seus mais de 2.000 poemas desenhados em guardanapos, movimentaram centenas de fãs em busca de autógrafos.

De escritores de temática dark à iluminada Monja Cohen, seja escrevendo ou meditando, o importante é dar seu melhor, é a mensagem que ela deixa vibrando no ar.

Passaram pelos corredores da festa, Ignácio de Loyola Brandão falando sobre seu novo livro Os olhos cegos dos cavalos loucos, ligado às suas memórias de infância, Zuenir Ventura, que conversou descontraidamente com Merval Pereira sobre os caminhos do jornalismo, João Anzello Carrascosa, um escritor sempre em busca de desafiar a si mesmo em novos projetos e linguagens. No espaço Hora da Prosa, filmes de animação do cineasta e ilustrador português José Miguel Ribeiro tratam com sensibilidade a questão ambiental.

Foi uma festa feita da alegria de compartilhar saberes, novidades, tradição em uma celebração do encontro com a criatividade, inspiração e cultura.

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Viviane Ka é escritora e roteirista de cinema. É editora da São Paulo Review

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