A São Paulo Review inicia, hoje, a série “Lendo o quê?”, em que pergunta para autores, pessoas ligadas ao mundo da letras e artistas quais seus livros de cabeceira do momento. A ideia é estimular o público do site a ler cada vez mais. A estreia é com o escritor Ronaldo Bressane. Veja abaixo as suas dicas.

 

10:04, Ben Lerner (Rocco). Apesar de mimizento, autocomplacente, hipocondríaco e outros vícios típicos dos millenials, e apesar de sua mentalidade autoficcional hipster até o último pêlo da barba, o norte-americano Lerner é um poeta com olhos e ouvidos afiados para as grandes contradições do nosso tempo, ri de si mesmo (e de seus pares artistas) o tempo todo e demonstra uma legítima ânsia por transcendência. Gostei deste ainda mais do que de Estação Atocha.

 

Um beijo por mês, Vilma Arêas (Luna Parque). A octogenária professora de literatura nascida em Campos (RJ) demonstra muito mais vivacidade e e frescor do que a maioria de seus contemporâneos. Avara, lança um livro a cada 10 anos, pois, como Wiszlawa Szymborska, “tem um cesto de lixo no escritório”. As pecinhas aqui, cheias de lirismo e violência, transitam entre o conto e o ensaio: seus temas são mendigos ameaçadores, taxistas galantes, mulheres violentadas, artistas e intelectuais estarrecidos com as desigualdades do país.

 

Nuvens, Hilda Machado (34). A professora de cinema carioca suicidou-se aos 50 deixando um enigmático legado: um conjunto de poemas surpreendentes em sua dicção ora lúcida ora luciferina. São versos perpassados pelo sentimento de “atuar sob o papel que seria destinado a outro ator” (miscast), um incômodo para o qual a única escapatória são as formas fugidias das nuvens, objeto de poemas belíssimos como “Impossibilidades”: “Viver suspenso nas nuvens/ pôr nas nuvens o meu amor/ e nunca mais cair das nuvens”.

 

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Ronaldo Bressane é escritor e jornalista, autor do romance Escalpo (Reformatório), entre outros. Siga-o no Instagram em @ronaldobressane

 

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