* Por Raimundo Neto *

O romance Simpatia pelo demônio, de Bernardo Carvalhoestampa na capa a pintura de “São Cristóvão carregando o menino Jesus”, de Bosch. Um aspecto apenas sobre a multidão de interpretações possíveis sobre a pintura é levantado por um dos personagens, no caminhar do livro. Bosch era considerado por Jung, psicoterapeuta que fundou a psicologia analítica, “o mestre do inconsciente, o descobridor do inconsciente”. A obra de Bosch emoldura o décimo primeiro romance do autor e, e isso indica alguns caminhos a serem considerados nesta resenha.

Os enigmas e supostos fanatismos de Bosch, na pintura, abrem o livro como caminhos paro entendimento esperado por um dos personagens sobre a dor que era querer e manter uma violência aparentemente inexplicável. Assim, entre fragmentos teóricos, ensaios produzidos pelos personagens, teses construídas fora da ficção, do renascimento ao cristianismo, do ocidente ao oriente, com pinceladas firmes de ritos pagãos, referências a teatros diversos e outras artes, a linguagem surge como saída do impossível, abcessos para o inconsciente. Simpatia é, no romance, palavra para afeição e também para ritual, e o demônio, um caminho para alguma iluminação condenada à beira da morte.

Não há nomes próprios para os personagens. Eles ocupam funções e aspectos, muitas vezes algo animal. Bernardo disse em entrevista que nomear homens como bichos potencializa a alegoria. Na arte, se há nomes dados, ainda assim a suposta função de metáfora é mantida. É neste caminho de alegorias, metáforas e revelações que o autor apresenta um tratado sobre o amor e sobre a violência.

Inconsciente coletivo, demônios íntimos

 “A ficção se desfaz no instante em que se revela” pág. 112

O personagem Rato, um agente comunitário para zonas de conflito, recebe uma missão considerada uma quebra de padrão. Ele é enviado para entregar o valor de resgate referente a um sequestro na mão dos sequestradores jihadistas, como se agisse por conta própria, sem envolver a agência em que trabalha ou os Estados que a financiam. Rato não conhece os mandantes, nem os reféns, e será demitido, apesar de funcionário de confiança.

Um profissional experiente, o Rato, em ascensão dentro da agência humanitária que mudou os modos de atuar em zonas de conflitos étnicos e religiosos. E ainda assim prestes a sucumbir a riscos desconhecidos. Havia um risco possível (e até provável) desde que aceitou a missão, riscos de agressão e morte, sem saber o porquê da investida, sem entender inicialmente os motivos para aceitar o encargo.

Ele é apresentado pelo narrador como à mercê de uma missão profunda e secreta. Mas Rato é também o tipo de funcionário que promove e alimenta difamações sobre si, de modo deliberado: tira proveito do sofrimento dos povos em conflito que visitava, da mesma forma com a qual alimentava preconceito a respeito desses mesmos povos, “os repetia, rindo, como piadas” (p. 24).

Depois de uma explosão no hotel onde se hospedava em Adis Abeba, Rato conta a história vivida há três anos, à beira dos seus cinquenta e três anos: início de sua relação com chihuahua, num teatro em Berlim. Conta a um homem turco com a perna ferida. Rato conta essa história com a “língua da sua infância” (p.68).

A referência ao contar o caso ao turco acidentado, bem como as falas de Rato para a terapeuta especialista em relacionamentos conflituosos, descortinam as supostas motivações inconscientes clarificando os desejos obscuros que o conectam a chihuahua e ao Palhaço, indícios de como a palavra é construtora de sentidos e escolhas, mas também caminho para exorcismos, para elaborações de conteúdos complexos e profundos.

Um homem com uma bomba amarrada ao peito não é inocente

“A intensidade era resultado de um problema com o tempo, de uma urgência, de uma rapidez e de uma impaciência insustentáveis, como se, correndo contra a morte, eles se aproximassem dela. Resultava também de uma extemporaneidade que dava à relação contornos exaltados e artificiosos da pior literatura contemporânea” pág. 110

 O personagem Rato é submetido a atentados à segurança de sua dignidade e autoestima. Enquanto narra seus desastres íntimos a um homem estrangeiro vestido num colete-bomba e sangue vazando, ele corre risco, o corpo prestes a ser dilacerado. Mas a palavra parece amenizar a sensação de perigo, não há nada a perder, já que a reputação foi aos ares, depois de um escândalo envolvendo um ex-amante perverso, o chihuahua; por isso Rato narra, retoma os sintomas, expressa as repetições de suas neuroses, os insuportáveis calos afetivos que lhe apertam o inconsciente.

Ao explanar, através de um narrador onisciente e supostamente neutro, com o auxílio do personagem da terapeuta de relações difíceis e através do sadismo do personagem Palhaço, o romance trata de relações mantidas através do controle perverso, equívocos de egos e vaidades inflamadas que trucidam e engolem o amor-próprio; é sobre entender apego como amor, e amor feito sacrifício; é ainda sobre dissimulações covardes e narcisismos adoecidos; sobre não enxergar o outro além de si próprio, e usar artimanhas para destruir e violar intimidades; sobre entregar-se a instintos e naturezas perversas que se articulam em amparar obscuridades, entre culpa e ressentimento, dor e mentira, movimentos inconscientes e experiências anteriores que moldam escolhas futuras.

É sufocante o avançar das complicações na adoecida e violenta relação de chihuahua e Rato: como um apaixonado de carência infiltrada na infância e seus apegos inseguros torna-se um cego que escuta nos olhos secos do amante manipulador um rio de conquistas.

O homem com um desejo sem nome no corpo não é inocente

“Onde está o detonador” (p.119) é o questionamento que abre a terceira parte do livro. O corpo do homem turco, explosivos amarrados ao corpo, continua no chão, a ouvir Rato contar reminiscências afloradas diante do risco da morte, do dilaceramento do corpo. É quando a personagem da terapeuta, especialista em separações e o Palhaço apresentam a Rato, com discursos, diálogos interventivos, reflexões cínicas, revelações sobre quem é chihuahua e quem é o próprio Rato. É aqui que o terceiro elemento adensa-se, Palhaço. O elemento íntimo, anterior, é explanado com questionamentos, alegorias, interpretações e refinamento: o desejo.

Palhaço não é o que faz rir, é o que revela a derrocada, a miséria de uma relação adoecida; revela o pior do espectador (o Rato). Palhaço assume na relação de Rato e chihuahua um papel e uma função reflexiva e sádica, um outro tipo de analista (nada profissional ou técnico, apenas como quem extrai conteúdos escondidos para maltratar). Palhaço expõe tanto quanto insinua, na voz do narrador; Palhaço controla revelações, alongando o controle antigo de chihuahua que parece não ter fim.

Palhaço aparece para supostamente explicar as motivações inconscientes das escolhas de chihuahua que o levavam até suas vítimas: “Tem a ver com a figura do pai (…) Ele tinha obsessão por escritores. (…) Não é preciso ser nenhum psicanalista para entender que uma coisa estava ligada à outra, não?” pág. 131

A iminência de uma revelação perpassa a narrativa, em terceira pessoa; a voz do personagem Palhaço e da terapeuta parecem detonadores, mas alertam para explicações que lançam luz aos conteúdos psicanalíticos freudianos e sua teoria do complexo de Édipo que moldou as escolhas de Rato e chihuahua. O romance segue assim desarmando-se, apresentando esclarecimentos psicanalíticos.

A narrativa aprofunda. Palhaço esclarece alguns fatos e a terapeuta de relacionamentos difíceis psicanalisa os muitos momentos vividos entre Rato e chihuahua.

O narrador conduz os personagens Palhaço e a terapeuta, revelando a carência fragilizada e personalidade vulnerável de Rato e as investidas abusivas e autorreferentes de chihuahua.

Há um perigo nas linhas do romance: sinalizar para contradições, algumas camufladas e latentes, que podem existir em sujeitos que se polarizam em pacíficos e explosivos, racionais e instintivos, em apresentar um tratado romanceado sobre sujeitos perversos, apegos ansiosos e casais violentos, mau caratismo e violências íntimas. É sobre os limites da integridade física e mental numa relação que chega a ser um atentado.

Ao longo do romance são apresentados fragmentos de teses e hipóteses teóricas que supostamente explicam a construção de vínculos, apego, empatia, para contextualizar a narrativa que, a cada página, apresenta novos detalhes sobre Rato e chihuahua e a relação adoecida entre eles. Explicações e hipóteses científicas são dispostas na narrativa para explicar, de certa forma, o que faz chihuahua um homem manipulador que passa “incólume ao amor que produzia nos outros” (p.148).

Um romance é um exorcismo

São apresentadas ao leitor algumas referências a “Sansão e Dalila”, de Max Liebernam, referências a Tchekhov, a Bosch, os estudos de Freud e Melanie Klen, Marquês de Sade, por exemplo, dentre outras muitas. As referências à peça “O asno de ouro”, de Apuleio, por exemplo, tratam sobre o objeto do amor e como o “amor sempre remetia a si mesmo” (pag. 174). Outras tantas teorizações sobre perversão, vaidade, frustração estão presentes no romance.

As referências a obras de arte e suas multiplicidades de interpretações atuam como uma possível forma de análise de alguns aspectos dos conteúdos inconscientes dos personagens. A obra de arte, a obra literária e a encenação teatral como significações que produzem insights, esclarecimentos e entendimentos possíveis sobre o que vivem os personagens. Mas essas referências são apresentadas por um narrador onisciente que vê tudo de fora e de perto, e pelos personagens terapeuta e Palhaço, amante de chihuahua.

O narrador constrói interpretações entendidas como psicanalíticas do campo estético da pintura, teatro e literatura. Por meio da leitura de algumas obras de arte, no romance, o narrador e, às vezes, a personagem terapeuta expõem e esmiúçam as obras como um caminho para liberação de conteúdo inconscientes e afetos, desde excitação sexual a raiva e tantas violências.

As obras de arte são expostas, analisadas pelo narrador, para apresentar o continuo e doloroso processo de compreensão das motivações de chihuahua e Rato na manutenção da violência, através da apreensão do “sentido oculto subjacente a elas” (Nakasu, 2010). Citando Nakasu, no artigo “Além das projeções do artista”, que cita Mezan, ela diz “Para Freud, ‘a obra de arte obtém o que a neurose não é capaz de realizar, isto é, a liberação do registro fantasmático pela liberação controlada dos processos primários (no autor) e pela diminuição da tensão psíquica resultante da eliminação provisória de determinadas repressões (no leitor)”.

Sobre erotismo e riscos, de Sade a Bataille, as teorias e estudos antropológicos, filosóficos ou psicanalíticos presentes suscitam leituras das relações descritas ao longo do romance; os personagens, humanos animalizados em alguns aspectos, com “seus corpos no lugar de Deus”, são também objetos de estudo para um leitor curioso, não lhe tivessem sido entregues todas as chaves a cada página por todas as teorias, estudos e hipóteses sugeridas. E Bernardo Carvalho também esclarece sem explicar: “A intenção do texto literário não tem nada a ver com nossa experiência”. Pág. 176

Há também a construção da linguagem e o uso dessa na fala e na construção de sentido, como um meio da encenação e como um escape para conteúdos inconscientes.

Existem menções a outros tratados sobre o amor e o objeto do amor, como um complemento teórico psicanalítico na voz da personagem terapeuta, sobre a astuta perversão e controle que chihuahua exercia sobre Rato, suas estratégias vis e indignas de “manter amantes e ex-amantes sob sua influência” (p.191). A especialista em separações segue teorizando o amor-entrega e sobre como chihuahua tornara-se um predador de vulnerabilidades e a fidelidade de quem estava disposto a servi-lo.

O narrador onisciente abre o entendimento a respeito da estrutura psíquica de um perverso manipulador, sobre a ambiguidade como elemento de sedução, explicações que ecoam ainda na voz da personagem terapeuta, o que funciona sempre como explicação para o personagem de Rato e para o leitor, que acompanha o personagem em todas as aparentemente impossíveis revelações.

Pela leitura da pintura de “São Cristóvão carregando o Menino Jesus”, de Bosch, por exemplo, Rato esperava uma revelação simples, para se ter livre daquela relação. Rato espera que uma obra de arte traga-lhe um clarificação. A arte, para Rato, com uma função de resgate de algo perdido, ou algo que nunca teve, ou algo que era seu e que pudesse ser transformado; que a sua leitura de um quadro fosse o resgate dos conteúdos lançados aos vãos da memória e à superfície dos olhos; que através de um espetáculo de teatro (mesmo as piores peças dirigidas e encenados pelo personagem Palhaço), ou através de poemas e romances, ele conseguisse sobreviver ao atentado do amor dissimulado de chihuahua. Assim, de outra forma, a missão aceita na agência humanitária também foi encarada por Rato como um modo de livrá-lo “do peso do mundo” (pág. 214), um sacrífico libertador.

A visão do demônio

Aqui, no corpo dos personagens, na ficção do romance, simpatizar com o demônio significa o quê? Segundo a religião dos iazidis (yazidis), Deus colocou a proteção da terra nas mãos iluminadas de sete divindades angelicais. Uma delas, a cultuada pelos iazidis, chama-se Melek Teus (Pavão Anjo); no entanto, diz-se que esse é o mesmo nome dado a Satanás (Shaytan) no Alcorão; assim, muitos muçulmanos radicais consideram os iazidis “adoradores do diabo”, e por isso são perseguidos há séculos por radicais muçulmanos. Melek Teus foi o anjo que se recusou a obedecer a Deus, que agradado antes de sua recusa (de prostra-se diante de Adão), concedeu àquele comando sobre a terra.

Descobrir o demônio é trazer à tona aspectos dolorosos do inconsciente. Enxergar o demônio é ver a si como alguém que escolhe fazer parte de um sistema adoecido de entrega, mentira, traição, culpa e apego. É evitar zonas de conflito exteriores, pacificar territórios em guerra, e não sobreviver a desastres íntimos. É assim que aos poucos Rato avança para a violência, em golpes e fugas lentas.

Como a escrita transforma o desejo em algo inexplicável? O desejo abraça também o campo extenso das ideias, mesmo que sua morada esteja em campos obscuros do inconsciente. É possível não saber o que nos leva ao corpo do outro, ao compromisso com o querer do outro, a entregas recíprocas, ceder a traições dos mais variados modos e tipos. Como é possível saber quase com exatidão o que nos faz próximos de uma escolha: ter esse alguém e não aquele outro? Palavras secretas, caminhos escondidos, relações empaladas em padrões e repetições, violências físicas e éticas, atentados ao amor despudorado: na ficção e na vida, aquilo tudo existe e não é impossível de explodir dignidades.

É então que o romance caminha para uma violência também na linguagem do narrador principal, onisciente e distante, e também dos personagens, quando Rato enxerga o demônio, “uma possessão, a encarnação do demônio no corpo franzino (…)” e atinge um soco no rosto do amante: a violência tornando-se golpe e gemido, sangue e gozo, até apagar a consciência do outro e aflorar os desejo inconscientes.

É assim que a obra de Bernardo abre em nós reflexões. Como outras referências e obras diversas abrem-se no romance.

Um tratado sobre a violência

Carvalho apresenta em Simpatia pelo demônio três homens num sistema perverso e alguns atentados; três homens e muitas contradições, na ficção; uma relação num sistema de pessoas animalizadas pelo instinto, pela carência e traição.

Os personagens são animalescos quando cedem à violência. E são humanos quando maltratam seus caminhos e ferem suas decisões. Trair é um modo de controle, e estar sob controle é um dos modos de inventar enganos e masturbar vaidades com a admiração apavorada. O que une chihuahua a Rato não é a carência, mas talvez a imaturidade de uma desesperança sem autoestima alguma.

É uma narrativa sobre o que existe de ambíguo no humano. Sobre promover atentados a regras e certezas. Dentro do risco de explosões e morte iminente, Rato relembra sua entrega a um homem abusivo, chihuahua, presa e cobaia. O mesmo homem que media zonas de conflitos violentos, em países com guerra cravada há anos e muitas mortes, é incapaz de evitar um atentado à integridade ética de sua crença no amor. Mas Rato não é corrompido pela indecência canhestra de chihuahua; seus desejos já eram animais antes do encontro.

A psicanálise presente na figura da personagem terapeuta é elaborada com destreza. A narrativa apresenta retrospectos fundamentais para que o leitor aproxime-se do entendimento das escolhas de Rato. Existem conceitos apresentados em diálogos ponderados, sem que a narrativa renda-se a teorizações que, muitas vezes, transformam livros de ficção em tratados enfadonhos.

Bernardo Carvalho constrói uma dinâmica relacional, na ficção, de três homens entregues a perversidades camufladas, contradições despidas de prudência, numa linguagem sem complexidades, a do narrador, para emprestar aos personagens uma complexidade relacional profunda de personalidades intrigantes. Isso quer dizer muitos detalhes: Que Bernardo escreveu um livro-sintoma sobre o amor e a entrega, e que se mantém um nome austero (?) da literatura contemporânea.

Um tratado sobre a violência

É no ato de encenar que um ator incorpora e vive o que inventa. No ato da escrita, o autor expurga a invenção que foi transformada de si para a página. O palco é a literatura, obra que se reescreve e acontece no entendimento do leitor/espectador. Ao apostar num narrador que esmiúça tanto as personalidades como as experiências passadas que, em teoria psicanalítica, justificam tais traços e escolhas, Bernardo Carvalho retira do leitor as possibilidades de que reinterprete a obra que vive em si.

As referências a Sade, obras de arte, teorias de Melanie Klein e Freud, conceitos de teatro, encenação e arte, apresentam ideias cuidadas sobre desejo, instintos, convicções burguesas, maldades e volubilidades e sedução. Como romance é um belo tratado sobre o amor e sobre a violência, e como obra de ficção coloca Bernardo como um habilidoso e erudito escritor contemporâneo.

A escrita de Bernardo é inteira e austera. Seus romances crescem e se fragmentam em pesquisas de temas diversos. Não sei a ordem (nem quis pesquisar) de seus romances, mas Simpatia pelo demônio ainda assim não me parece inovador (e nem precisa ser). No entanto, ao final da leitura, dois pensamentos permaneceram demonizados: 1: Mais do mesmo. 2: O autor continua potente.

O romance é um exorcismo

É possível entender este livro como uma forma de entrega e um jeito de buscar. Afeiçoar-se no sentido de ter para si, e também como ritual, como construção de crenças e exorcismo de obsessões, sobre ser possuído e consumido por possessão desmedida, uma paixão encarnada que cega e limita, mas também liberta de algo pior.

Ao final do romance, seguimos Rato desabafar, depois de uma explosão, ao curdo que tem uma bomba amarrada ao corpo, e questioná-lo: “Onde está o detonador?” (pág. 234).

O livro passa pela arte, por aspectos sagrados do amor e das divindades, pelos exageros de religiões e crimes, aspectos profanos e violentos do privado e do público, para apresentar um demônio e modos de convertê-lo em humano.

É assim que Rato, quase livre do demônio do amante abusivo, do amor doentio e traidor, tenta ajudar o curdo que não conseguiu cumprir a missão do atentado. Rato entrega o dinheiro do resgate ao curdo, veste-o com suas roupas, empresta sua identidade, simpatizando com aquele, e o corpo do homem que não é Rato leva a última carta de chihuahua.

É no final do romance, após insights, leituras de obras de arte, ensaios, teorias, hipóteses, reestruturações de conteúdos latentes e inflamados, que ocorre o exorcismo.

“É a última vez que se ouve falar do Rato”. Pág. 236

*

Simpatia pelo demônio, de Bernardo Carvalho (Companhia das Letras, 240 págs.)

*

Avaliação: _avaliação_pena (bom)

*

Raimundo Neto é escritor e crítico literário

 

Tags: